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28.4.04

D. Teodósio Clemente de Gouveia, 1.º Arcebispo de Lourenço Marques. 
Porventura o maior defensor da causa colonial portuguesa no seio da igreja católica fosse o Arcebispo de Lourenço Marques, o Cardeal D. Teodósio Gouveia. No seu relatório anual de 1958, enviado ao Governador-Geral, anunciava a inauguração do Seminário S. Pio X nos seguintes termos:
«Foi inaugurado no começo do ano escolar de 1958-1959 este novo Seminário. Destina-se a seminaristas europeus ou filhos de europeus. (…) O facto deste Seminário destinar-se apenas a seminaristas brancos, não é por espírito racista, mas pelo facto de a distância social e educativa entre as crianças brancas e pretas ser ainda muito grande».
Teodósio Clemente de Gouveia nasceu a 13 de Maio de 1889 em S. Jorge, na ilha da Madeira. Foi ordenado sacerdote a 19 de Abril de 1919, no Funchal, e apontado como Prelado de Moçambique em 18 de Maio de 1936. A 5 de Julho desse mesmo ano era elevado a Bispo, sendo apontado como 1.º Arcebispo de Lourenço Marques a 4 de Setembro de 1940, lugar de que tomaria assento em 18 de Janeiro de 1941. Em 18 de Fevereiro de 1946 era elevado à condição de Cardeal. Faleceu em 6 de Fevereiro de 1962. Foi substituído no cargo por D. Custódio Alvim Pereira (n. 1915, São João do Monte, Portugal) em 3 de Agosto de 1962, o qual resignaria em 26 de Agosto de 1974 para dar o lugar ao primeiro bispo africano de Lourenço Marques, D. Alexandre José Maria dos Santos (n. 18 de Março de 1924, em Zavala, Moçambique) em 23 de Dezembro desse mesmo ano. Em 18 de Setembro de 1976, e apenas nessa data, a Arquidiocese de Lourenço Marques tomaria o nome da capital do novo país independente: Arquidiocese de Maputo. Desde 22 de Fevereiro de 2003 está apontado como Arcebispo de Maputo, mas sem ter ainda tomado posse do lugar, o actual Bispo de Pemba, D. Francisco Chimoio.

16.4.04

D. Sebastião Soares de Resende, 1.º Bispo da Beira. 
O manifesto da Diocese da Beira, de 1953, transcrito no post anterior, reflecte de uma forma clara as posições nucleares da Igreja Católica quanto à política indígena, incitando à perseguição de outros cultos religiosos, defendendo a repressão de traços identitários das culturas africanas e, em simultâneo, impondo as marcas culturais europeias às populações «indígenas». É sabido que o Bispo da Beira, D. Sebastião Soares de Resende, seria o mentor no seio da Igreja Católica, já no decurso da década de 60, das posições mais críticas do regime colonial português em Moçambique. Tal inflexão explica-se, estamos em crer, porque entretanto a situação colonial tinha ganho uma nova qualidade com as manifestações proto-nacionalistas (de que o levantamento de Mueda, em Junho de 1960, é o exemplo mais paradigmático) e o início da guerra colonial. Todavia, em algumas das suas primeiras pastorais, como em «Ordem anticomunista», de 1950, já se encontram explícitas críticas ao sistema colonial português, nomeadamente ao regime de cultura obrigatória de algodão.
Sebastião Soares de Resende nasceu a 14 de Junho de 1906, em Milheirós de Poiares, uma freguesia da Vila da Feira (hoje Santa Maria da Feira), a pouco mais de 40 km do Porto. Tendo sido ordenado padre a 21 de Outubro de 1928, foi apontado pelo Vaticano como Bispo da Beira a 21 de Abril de 1943, tomando assento do lugar em 15 de Agosto do mesmo ano. Faleceu a 25 de Janeiro de 1967.
Muito activo no plano social, as suas prédicas e pastorais revelariam um crescente sentido crítico sobre a situação colonial, mais assertivo depois do seu regresso do Concílio II do Vaticano (1962-1965), onde foi o prelado português mais interveniente, com 10 comunicações num total de 35 (eram 42 os Prelados portugueses com assento no Concílio). D. Eurico Dias Nogueira, entretanto nomeado Bispo de Vila Cabral (hoje Lichinga) no decorrer dos trabalhos do Concílio, a 14 de Julho de 1964, – integrando-o só depois dessa data –, destaca as intervenções do Bispo da Beira pela diferença no «ambiente eclesiástico de então em Portugal, conservador e tradicionalista».
Na linha oposta à do 1.º Bispo da Beira situava-se o então Arcebispo de Lourenço Marques, o Cardeal D. Teodósio Gouveia, perfeito paladino da causa colonial.

8.4.04

A «política indígena» da Diocese da Beira em 1953. 
Pela força que lhe advinha do «Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas da África e Timor», de 13 de Outubro de 1926 (consulado de João Belo) mas, sobretudo, da Concordata e do Acordo Missionário, estabelecidos entre Portugal e a Santa Sé em 1940 — depois reforçada, em 1941, sobre a forma de lei fundamental com a publicação do «Estatuto Missionário» —, a Igreja Católica propôs-se, amiúde, intervir na política colonial portuguesa, sobretudo no que à política indígena dizia respeito. O artigo 2.º do «Estatuto Missionário» conferia-lhe especialmente esse mandato: «As missões católicas portuguesas são consideradas instituições de utilidade imperial e sentido eminentemente civilizador». Um manifesto da Diocese da Beira sobre política indígena, de finais de 1953, é a esse respeito muito objectivo. Tendo-se reunido entre 12 e 18 de Outubro de 1953 o Bispo da Beira, D. Sebastião Soares de Resende, com cerca de 45 padres e missionários provenientes de todas as Missões da Diocese, redigiu-se um documento no qual se forneciam algumas sugestões de política indígena ao governo da colónia:
«a) reprimir os feiticeiros …; b) proibir os batuques imorais … bem como outras danças secretas como o Nhau, que são verdadeiramente diabólicas; c) expulsar os sequazes das seitas protestantes do Sionismo, Adventistas do 7.º Dia e do Watch Tower que nutrem ideias subversivas; d) não admitir ao serviço do Estado, em repartições públicas, indígenas protestantes e maometanos; e)insistir na isenção do imposto do casal monogâmico com quatro filhos menores; f) cumprir a faculdade de o indígena escolher o patrão de trabalho; g) urgir a proibição da poligamia; h) combater severamente o contrato de raparigas para casamento antes de elas terem 14 anos; i) advertir as autoridades administrativas para não intervirem em casamentos canónicos; j) ordenar que a área de algodão a cultivar seja entregue à família, isto é ao homem e filhos maiores e não à mulher que cuidará da casa e da alimentação; k) o mesmo para a cultura do arroz; l) obrigar as empresas com pessoal indígena em concentração a fazer escolas para esse pessoal; m) criar lei severa, se ela ainda não existe, que puna severamente os europeus e euro-africanos que abusem de raparigas indígenas; n) obrigar os rapazes e raparigas a irem regularmente à escola; o) estudar o assunto dos sobrenomes a dar aos indígenas; p) impedir de qualquer modo e absolutamente que se edifiquem mesquitas em todas as regiões da Província».
Poder-se-ia arguir que este conjunto de medidas apenas poderiam ser classificadas de paternalistas e que mesmo algumas delas, quando muito, configurariam uma situação de discriminação positiva. Mas não nos iludamos: até uma data muito tardia, a Igreja Católica foi, na sua maioria, conivente com a situação colonial, assegurando a manutenção da alteridade essencial entre colonos e colonizados, mesmo quando um dos seus mais destacados dirigentes respondia pelo nome de D. Sebastião Soares de Resende, Bispo da Beira.

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